sexta-feira, 22 de abril de 2011

Os homens do mar


Por entre as grades de proteção da ponte do São Francisco dá para ver o mar – mas que quase ninguém vê quando toda vista vira rotina. Às vezes dizem que o mar não está para peixe, mas por aqui sempre está. Toda hora tem algum pescador de linha, tarrafa ou barco; aqui e acolá uma ave marinha qualquer mariscando na baba do oceano.

Três homens lançam a tarrafa à sorte, tendo ao redor de si um mar agitado, ainda que este lhes bata na altura da cintura. A experiência do mar é suficiente para que tenham respeito por ele e não medo. O utensílio com o qual pescam e que é conhecido por tarrafa tem um aspecto tosco, sem mencionar a impressão de inutilidade que passa. Contudo muito se engana quem à primeira vista de algo relega-o quase que imediatamente aos vasto espaço do imprestável, os pescadores, que não diferenciam essência de aparência, a utilizam com precisão, enquanto a filosofia não se decide.

O mar não é mais visto como antes. Respeito, prudência e reverência são atributos que carrega apenas por ser o que é em si mesmo. Os pescadores, cujas peles brilham ao sol do impiedoso começo de tarde, mais do que tirar das águas aquilo que é capaz de lhes dar sustento e a própria identidade (uma força que define o que somos pelo que fazemos), rezam no silêncio a inconsciente oração do homem que tudo sabe e nada sabe; esquece e não esquece; a oração de quem se espanta com o mundo que tudo cerca de alegrias e tristezas. Os três pontinhos no mar são apenas homens que pescam peixes. O mar não diferencia homens de peixe.