domingo, 4 de outubro de 2009

Só sente fome quem come


Somos seis bilhões de pessoas que vivem em um mundo apertado, escasseando todo tipo de recurso que ele tem e tudo o mais. Não demorarão quinze anos e seremos sete bilhões. Sete bilhões e fazendo as mesmas coisas que os outros seis bilhões já faziam, só que acrescidos de um bilhão. Nossa natureza é selvagem, devoradora, quase que insaciável em sua essência.

Calculamos, fazemos estatística e aritmética. A fome vai crescendo bilionária, logarítmica, progressiva e vamos calculando a nossa miséria, atrapalhados que nem macacos com o ábaco nas mãos. Viver, neste caso, é experiência única; é sentir na pele a mordida que a consciência dá naqueles que sentem o mundo crescendo invariável ao redor, sufocando, consumindo a certeza de que se é intocável.

Fazemos ginástica, ioga, bebemos cerveja, uns balançam a pança, outros seguram – que a fome aperta –, plantamos mandioca, bananeira, damos até pirueta e olha que não é circo, mas não deixa de ser engraçado e no final quem morre é o público, de sede, fome, frio, cansaço, sem graça. Ai meu Deus, se este mundo – como dizem por aí– é mesmo um circo, eu já até me sinto um palhaço.

Pra se resolver o problema de nossa fome já se tentou de tudo, sobretudo no que se tem em matéria de “ismo”. “Ismo” pra cá, “ismo” pra lá, “ismo” pra todo lado. Cabalismo, zen-budismo, “achismo”, “filosofismo”. Uns, mais comedidos, tentaram o comunismo; os mais afoitos, capitalismo. Deu em “nadismo”. Eu sugiro outro “ismo”: canibalismo. Porque se comer o outro não mata a fome de quem come, pelo menos mata a de quem é comido.

4 comentários:

  1. Nossa...

    Este texto ficou meios do tipo.. esquisitismo..r..rs.

    Mas tá valendo..

    ;)

    Bjos

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  2. "Porque se comer o outro não mata a fome de quem come, pelo menos mata a de quem é comido".Muito boa essa, hehehe. Verdade,as vezes a morte é a sábia súbita saída.

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  3. 7 bilhões de pessoas, com grande parcela passando fome e outra parcela maior ainda desperdiçando o que tem ou sub-aproveitando o q dispõe... bem típico do homem mesmo.

    Só não concordo que já tenha se tentado de tudo, falta ainda tentar querer fazer de verdade. Talvez até desse certo.

    :)

    ps.: gostei da linguagem que você usou pra tratar de um assunto tão sério.


    www.euthiagoassis.blogspot.com

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  4. Ótimo texto, Thomaz. Uma "ironia neomalthusiana", infelizmente, bem realista. Li uma coletânea de contos de humor, empréstimo de biblioteca, não lembro o autor do texto, mas ele desenvolvia a sugestão que você deu no fim deste, pelo mesmo motivo. Sempre estivemos perdidos (o texto é do século XVIII).

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